O espelho que reflete o rosto de quem está prestes a morrer na família.
**O Espelho da Sombra: O Que Ele Revela Sobre a Vida Que Se Apaga?**
Em uma casa modesta nos arredores de Campinas, no interior de São Paulo, um espelho antigo, com a moldura gasta e o vidro manchado pelo tempo, guarda um segredo sombrio. Não é um segredo guardado em caixas empoeiradas ou sussurrado em corredores escuros. É um segredo que se revela em reflexos fantasmagóricos, um prenúncio silencioso da partida. Dizem que, em momentos cruciais, esse espelho mostra o rosto de quem está prestes a morrer na família.
Dona Lúcia, 78 anos, a matriarca da família Silva, segura em suas mãos uma foto desbotada de seu falecido marido, Seu Joaquim. Seus olhos, antes vibrantes, agora carregam a melancolia de quem já viu demais. Ela me conta, com a voz embargada, sobre a vez que o espelho se manifestou pela última vez.
“Era o meu cunhado, o Antônio. Ele estava doente, já há algum tempo, mas ninguém esperava que fosse tão rápido. Uma tarde, eu estava arrumando a sala, e passei em frente ao espelho. No começo, achei que fosse a minha imagem, cansada. Mas quando olhei direito… não era eu. Era o Antônio. Com a mesma feição que ele tinha nos últimos dias, fraco, os olhos quase fechados. Eu gritei, chamei meu marido. Quando ele chegou, o reflexo já tinha sumido. Naquela noite, o Antônio partiu.”
A história de Dona Lúcia não é um caso isolado. Pelo menos, não para os moradores da rua das Flores, onde a casa dos Silva se localiza. A casa, com suas janelas de madeira e o quintal florido, parece imune à agitação da cidade, um refúgio de memórias e, agora, de um mistério ancestral.
Seu João, vizinho de Dona Lúcia há mais de quarenta anos, confirma a lenda. “Conheço essa história desde moleque. Minha avó já falava desse espelho. Lembro que uma vez, o meu tio, que morava longe, ficou muito doente. O meu pai, que era muito apegado a ele, dizia que via o rosto do tio no espelho. E não deu outra, o homem faleceu no dia seguinte.”
O contexto social em que essa história se insere é o de uma comunidade onde as crenças populares ainda têm força. Em um país marcado pela fé e pela superstição, o espelho da sombra se torna mais do que um objeto; é um portal entre o mundo dos vivos e o dos mortos, um lembrete constante da fragilidade da vida e da inevitabilidade do fim.
Maria Eduarda, neta de Dona Lúcia, 22 anos, cresceu ouvindo sobre o espelho. Para ela, é um mistério assustador, mas também um elo com as gerações passadas. “É estranho. Eu sempre tenho um friozinho na espinha quando passo perto dele. Mas ao mesmo tempo, me sinto conectada com a minha bisavó, com as histórias que ela contava. É como se o espelho guardasse um pedaço da nossa história, das nossas perdas.”
Dona Lúcia, com o olhar fixo na janela, murmura: “O espelho não mente. Ele mostra o que a gente não quer ver, mas que precisa saber. É um aviso, eu acho. Pra gente se despedir, pra gente dar valor enquanto ainda há tempo.”
O espelho, pendurado na parede da sala, um guardião silencioso de tragédias e de despedidas, continua ali, indiferente ao burburinho da vida. E a pergunta que paira no ar, densa como o cheiro de terra molhada após a chuva, é: em quantas outras casas esse espelho, ou outro artefato similar, reflete a sombra da morte, esperando o momento exato de revelar seu segredo mais sombrio? E o que mais ele pode contar sobre os que se foram e os que estão por vir?
Por: Silas Thorne, o Cronista do Insólito

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