A sensação constante de estar sendo seguido, mesmo em locais públicos.
**O Sombra Que Nos Habita: A Angústia de Viver Sob Vigilância Constante**
O sol do fim de tarde banha a Avenida Paulista, um palco vibrante de vida em São Paulo. Pessoas caminham apressadas, famílias passeiam, turistas tiram fotos. Mas para Ana Clara, 28 anos, cada passo é medido, cada olhar é desconfiado. Ela sente. Sente a vibração no ar, um arrepio que não vem do vento. Sente o peso de um olhar que não encontra o seu, mas a escaneia.
“É como se eu estivesse sempre em um filme, mas sem saber quem é o diretor ou qual é o meu papel. Só sei que tem alguém me observando”, desabafa Ana Clara, em um café discreto em Pinheiros, com a voz embargada. Ela usa óculos escuros, mesmo com a iluminação fraca. “Começou sutilmente. Um carro parado na mesma rua por dias, um homem no ônibus que parecia sempre estar na mesma linha que eu. Agora, virou rotina. Uma rotina que me consome.”
Ana Clara não é a única. Nas redes sociais e em conversas sussurradas, a sensação de estar sendo vigiada, mesmo em plena luz do dia, tem se tornado um eco cada vez mais alto. Não se trata de um caso isolado, de paranoia individual. É um reflexo de um tempo onde a linha entre o público e o privado se esfacela, e onde a tecnologia, antes vista como facilitadora, se transforma em um potencial instrumento de controle.
Carlos, 55 anos, um aposentado que prefere não revelar seu sobrenome por medo de represálias, relata experiências semelhantes. “Eu simplesmente não saio mais de casa sem sentir aquele frio na barriga. Se estou no mercado, olho para trás a cada corredor. Se vou à padaria, percebo se alguém demorou um pouco mais para sair. Não tem explicação lógica, mas a sensação é visceral.” Carlos acredita que o envolvimento em algumas manifestações políticas há alguns anos pode ter sido o gatilho. “Nunca fiz nada de errado, mas a sensação de que quem não deveria sabe quem você é e o que faz… isso te paralisa.”
A psicóloga Marina Costa, especialista em ansiedade e estresse pós-traumático, explica que essa percepção não deve ser desconsiderada. “Estamos falando de um estado de hipervigilância. O corpo e a mente entram em alerta constante, interpretando estímulos neutros como ameaçadores. Isso pode ser desencadeado por diversos fatores: experiências traumáticas, situações de violência presenciadas, ou até mesmo uma percepção generalizada da insegurança e da falta de privacidade na sociedade moderna.”
Para Ana Clara, a vigilância constante se manifesta em detalhes cotidianos: a hesitação antes de postar uma foto, a desconfiança diante de um número desconhecido no celular, a escolha de caminhos menos movimentados, mesmo que mais longos. “Você começa a se moldar. A apagar rastros que nem sequer foram criados. É como viver em uma gaiola invisível. Você não está preso fisicamente, mas a sua liberdade de ser e de agir é severamente comprometida.”
O contexto social amplifica essa sensação. A proliferação de câmeras de segurança em espaços públicos, a coleta massiva de dados por empresas e governos, a facilidade com que informações pessoais podem ser acessadas online – tudo isso contribui para a criação de um ambiente onde a vigilância se normaliza, e a desconfiança se instala como um instinto de sobrevivência.
Mas o que realmente assusta Ana Clara não é apenas o medo do “sendo seguido”. É a solidão da experiência. “Você tenta falar, mas as pessoas acham que você está exagerando, que é coisa da sua cabeça. Mas eu sei o que sinto. E sei que tem mais gente sentindo o mesmo, em silêncio.”
Afinal, quem são essas sombras que nos espreitam nas esquinas, nos reflexos das vitrines, nas linhas de código que nos definem? E quando a vigilância deixa de ser um mero sentimento e se torna uma realidade inescapável, onde encontramos a segurança para simplesmente sermos nós mesmos? A resposta, assim como as sombras que nos cercam, ainda permanece envolta em mistério.
Por: Silas Thorne, o Cronista do Insólito

Deixe um comentário