Uma costureira que cria vestidos para ocasiões especiais, mas é impedida de participar do evento que os usa.
**Por [Seu Nome de Jornalista Investigativo], especial para [Nome da Publicação Fictícia]**
O aroma de linho e a doçura sutil de lavanda pairam no pequeno ateliê de Dona Elza, um cômodo apertado, mas vibrante, que se espreme entre uma lavanderia barulhenta e uma quitanda sempre movimentada no bairro da Vila Mariana, em São Paulo. As paredes são um mosaico de retalhos coloridos, amostras de tecidos e fotos desbotadas que registram os sorrisos que ela ajudou a materializar. Cada máquina de costura, uma relíquia antiga com um zumbido familiar, parece ter vida própria, tecendo não apenas fios, mas também esperanças e memórias.
Dona Elza, 72 anos, mãos calejadas que dançam com agilidade improvável sobre o tecido, é a arquiteta de vestidos que moldam a felicidade em momentos únicos. Debutantes deslumbrantes, madrinhas radiantes, formandas com o futuro nos olhos – todos já desfilaram com suas criações. Ela conhece cada centímetro de seda, cada brilho de paetê, cada dobra de cetim que transforma um pedaço de pano em um portal para a realização de um sonho.
“Ah, meu filho, quando vejo a menina entrando na festa com o vestido que fiz… é como se eu também estivesse lá”, diz ela, os olhos úmidos e o sorriso enrugado se alargando. “É a minha parte naquela alegria. A minha assinatura invisível no brilho dos olhos delas.”
Mas há um xis no mapa da sua satisfação. Um ponto cego na tapeçaria dos seus sucessos. Dona Elza nunca vestiu um dos seus próprios vestidos em uma ocasião especial. O salto de seda, a tiara delicada, o abraço caloroso do baile – tudo isso lhe é negado.
“A gente faz para os outros, né? A gente se dedica, dorme pouco, se machuca nos dedos, mas o resultado é para ver o outro feliz”, confessa, enquanto ajusta um espartilho com pedrarias que parecem estrelas caídas. “O meu próprio vestido… quem tem dinheiro para isso? Quem para pra pensar na Elza quando tem que escolher a cor do buquê?”
A sua jornada de vida, como a de tantas mulheres brasileiras de sua geração, foi uma constelação de renúncias em prol da família. Criou os filhos, cuidou dos netos, e a sua própria necessidade de brilhar em algum momento foi engolida pela urgência das contas e pelo amor incondicional.
“Teve uma vez, a filha da minha amiga, a Ana, ia se casar. Ela me deu um vestido lindo, um marfim todo bordado. Eu fiquei tão feliz! Ia finalmente usar algo tão bonito”, relembra, a voz embargada pela memória. “Mas aí o meu neto mais velho teve uma febre muito alta, precisou de um remédio caro. O vestido ficou guardado no armário. Fui para a festa com a roupa que tinha, cuidando do menino.”
O contexto social se revela como um véu pesado sobre a realidade de Dona Elza. Enquanto ela habilmente confere o caimento perfeito em um vestido que custará o equivalente a meses de aluguel, ela mesma vive em um apartamento modesto, dependendo da aposentadoria mínima e dos poucos trabalhos que recebe. A beleza que ela semeia em celebrações exclusivas não reverbera em sua própria vida.
A sua cliente mais fiel, Sofia, uma jovem advogada de 30 anos, testemunha a dedicação da costureira. “Dona Elza não faz vestidos, ela faz magia. A minha formatura, o casamento da minha irmã, até um evento importante do meu trabalho, ela criou peças que me fizeram sentir a pessoa mais confiante do mundo. Ela entende o que você quer antes mesmo de você dizer”, conta Sofia, com a voz carregada de admiração. “É injusto que a pessoa que nos faz brilhar tanto, ela mesma tenha que ficar na sombra.”
Sofia tenta, dentro de suas possibilidades, oferecer algo em troca, um presente, um convite para um evento. Mas a modéstia de Dona Elza sempre a impede de aceitar algo que ela considere desproporcional. “Eu não quero ser um peso, meu bem. Meu trabalho é para elas, o que eu faço é com amor.”
A temporada de casamentos e formaturas está a todo vapor. O ateliê de Dona Elza fervilha. O tilintar das agulhas, o zunido das máquinas, a conversa animada das clientes que buscam o vestido dos seus sonhos. E no meio de tudo isso, ela, a artesã da felicidade alheia, a costureira que veste o glamour, permanece à margem da festa, a sua própria celebração adiada indefinidamente.
Será que um dia Dona Elza irá sentir o peso do cetim em seus ombros, o brilho das pedrarias em seu decote, e dançar sob a luzes de uma festa para a qual ela, e não apenas suas mãos, contribuiu para o esplendor? Ou o seu legado será apenas o reflexo distante no espelho das outras, um espelho que ela mesma poliu com tanto esmero?
Por: Felipe Bastos Guimarães

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