O diário de um antepassado que descreve um ritual para afastar uma entidade familiar.
O Lamento nas Margens do Velho Rio: Um Diário Revela o Ritual que Tentou Salvar Uma Família
*Por [Seu Nome de Jornalista], Investigador Histórico*
**A poeira do tempo se acumula em caixas de madeira esquecidas no sótão de uma casa centenária em São Miguel do Piracicaba, Minas Gerais. Entre cartas amareladas e fotografias desbotadas, encontramos um diário. Uma relíquia escrita à mão, cujas páginas guardam segredos sombrios e um ritual que ecoa através de gerações: a tentativa desesperada de livrar uma família de uma “entidade” que a assombrava.**
As anotações, feitas em uma caligrafia elegante, mas cada vez mais trêmula, pertencem a Dona Elza, que viveu entre o final do século XIX e o início do século XX. Sua narrativa não é de monstros ou aparições fantasmagóricas tradicionais, mas de um mal sutil, um peso no ar, uma desgraça cíclica que parecia se apegar aos homens de sua linhagem.
“12 de Março de 1908”, lemos na primeira página relevante. “Meu Rogério, tão cheio de vida, definha. O médico nada. Diz que é a febre, mas eu sinto. Sinto que não é desta terra. Uma frieza que vem do peito dele, como se outro habitasse em seu lugar.”
Dona Elza descreve a atmosfera opressora que pairava sobre a fazenda. As colheitas estragavam inexplicavelmente, os animais adoeciam, e os homens da casa, um a um, pareciam sucumbir a uma melancolia profunda, uma agressividade repentina ou uma doença incurável que os levava precocemente. O viés social da época, com a forte influência da religião e crenças populares, tornava a busca por explicações além da ciência comum uma necessidade.
“As vizinhas cochicham. Dizem que é olho gordo, maldição. Mas a Senhora Marta, da capela, me falou em outra coisa. Algo que reside em nossa casa, talvez pelos pecados antigos de meu avô. Ela me ensinou um caminho. Um caminho de purificação, de oferenda. Para que o mal se retire.”
O diário detalha o ritual. Não era algo que se encontrasse em livros de magia populares. Era uma mistura de preces católicas com elementos ancestrais, talvez de origem indígena ou africana, absorvidos pela cultura local. Dona Elza narra a coleta de ervas específicas – arruda para proteção, guiné para afastar o mal, alecrim para purificar. O local escolhido era a beira do rio Piracicaba, de onde tirou a água para benzimento.
“Na noite de São João, sob a lua cheia, quando as almas andam mais soltas, fui até o rio. Levei sal grosso, um punhado de cada erva, e um pedaço do cabelo de meu Rogério. Fiz uma cruz com os galhos mais fortes que encontrei. Repeti as palavras que a Marta me ensinou, com fé e com medo. Pedi perdão pelos erros de quem veio antes de mim e supliquei que a força boa voltasse a reinar em nosso lar.”
O relato de Dona Elza é permeado por detalhes da vida cotidiana, mostrando que o medo e a esperança coexistiam com as rotinas de uma família do interior. Ela descreve o cheiro do pão assando no forno a lenha, o som dos grilos na noite, a dificuldade em cuidar da horta enquanto o coração apertava.
“Hoje, Rogério sorriu pela primeira vez em semanas”, anota Dona Elza, com uma caligrafia que volta a ganhar firmeza. “Um sorriso pequeno, mas genuíno. Será que o rio ouviu minhas preces? Será que a Senhora Marta estava certa?”
A esperança, porém, é efêmera. As últimas páginas do diário trazem de volta a sombra. “20 de Setembro de 1909. Rogério voltou. A frieza nos olhos. O silêncio que grita. A entidade não se foi. Ela apenas dormiu, esperando o momento de retornar. Sinto-me cansada. O fardo é pesado demais para uma só mulher carregar.”
Dona Elza não registra mais o ritual. Seu diário termina abruptamente. O que aconteceu com ela e com a família? A “entidade” os consumiu por completo, ou a luta continuou em outras formas, em outras gerações?
As anotações de Dona Elza levantam questionamentos profundos sobre as forças que moldam nossas vidas e sobre os legados, nem sempre visíveis, que nossos antepassados deixam para trás. E nos fazem pensar: seriam esses rituais apenas superstição, ou um elo ancestral com saberes que a modernidade tenta apagar, mas que ainda ressoam nas profundezas de nosso ser?
**Será que o véu entre o que vemos e o que nos assombra é mais fino do que imaginamos, e a força de um rio, a terra e algumas ervas ainda guardam segredos para nos proteger do que não podemos nomear?**
Por: Felipe Bastos Guimarães

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